
- Karin Nisiide
- 2 de março de 2021
2020 foi, sem dúvida, o ano mais difícil para a história da hotelaria nacional e internacional. Felizmente ele ficou para trás. E com ele, a esperança de melhoras no setor. Com a chegada das vacinas, vimos uma luz no fim do túnel. Mas será que essa retomada vai ser rápida?
Infelizmente a resposta é não. A pandemia não acabará como mágica de uma hora para outra, nem com a vacina, que será demorada e burocrática. E algumas mudanças, que consideramos temporárias, vieram mesmo para ficar. Se o mundo não é mais o mesmo, é absolutamente natural que o hóspede também não seja.
Por outro lado, nunca falamos tanto da nossa vontade e paixão por viajar como em 2020! Da saudade de rodar o mundo livremente. Além disso, nunca se discutiu tanto a responsabilidade de nossas viagens – o que definitivamente renderá bons frutos de 2021 em diante.
Importantes tendências para a hotelaria em 2021 vieram justamente de transformações comportamentais geradas no ano passado – e devem seguir firmes nos próximos anos.
O turismo retornará no segundo semestre?
A retomada das atividades do turismo entendidas como “normais” ainda irão demorar. Mas acredita-se que terão uma boa melhora a partir do segundo semestre de 2021.
Em 2020, a pandemia deixou diversos hotéis sem hóspedes por meses a fio. Com experiências distintas (variando muito em função das regras locais para contenção da pandemia, é claro), a reabertura desses hotéis veio acompanhada de diferentes soluções possíveis para diferentes tipos de hóspedes. A palavra de ordem foi “reinventar-se”, todos tiveram que adaptar seus negócios à nova realidade.
Soluções antes disponíveis apenas para hóspedes tornaram-se possíveis para uma gama muito maior de potenciais clientes para diversas propriedades. Muita gente viu, justamente durante a pandemia, surgir a chance de poder finalmente acessar de alguma maneira serviços de hotéis nos quais sempre sonhou em se hospedar. Outros descobriram o prazer de se hospedar em bons hotéis em sua própria cidade, mesmo “sem viajar”, mudando de ares e renovando energias.
Mas as pessoas ainda querem sair, querem viajar, querem ver pessoas. E o conceito de “revenge travel” finalmente está migrando do hemisfério norte para cá e pode impulsionar muitas viagens ainda neste ano.
“Revenge travel”, um termo que poderia ser traduzido como “viagem da desforra”, deriva de “revenge spending”, termo surgido na China nos anos 80 para se referir ao excesso de gastos (ou mesmo compulsão consumista) após longos períodos de privação de consumo. No setor de hostels, temos um exemplo muito conhecido: grupos de israelenses, que após um longo período em serviço militar obrigatório, saem viajar pela América do Sul, em busca de aproveitar todo o “tempo perdido”.
Diferentes especialistas em turismo, aqui e lá fora, preveem comportamento semelhante com as nossas viagens no pós-pandemia: após tanto tempo com tanta gente privada de viajar livremente por aí, estão esperando um boom no setor a partir do segundo semestre deste ano.
Mas não serão todos os tipos de viagens que retornarão ao mesmo tempo.
Especialistas preveem que as viagens de lazer retornarão primeiro, e as pessoas continuarão a viajar em pequenos grupos – provavelmente com pessoas com quem estiveram em quarentena. Até então, a maior procura foi nas viagens locais, mas estima-se que em meados de 2021 veremos um ressurgimento das viagens de longa distância.
Confira as tendências mais discutidas para a hotelaria em 2021!
1- Modelo Low Touch e Contactless
O modelo Low Touch é definido pelo baixo nível de interação física entre potenciais clientes e colaboradores ou intermediadores, além de protocolos de higiene bastante rígidos, para viabilizar as transações comerciais que só podem ser feitas de maneira presencial. Isso ocorre pela automação de processos no lugar de tarefas e contatos manuais e repetitivos.
Reduzindo o número de contato físico feitos no atendimento, o cliente tem mais conforto e segurança ao utilizar o serviço.
É o caso do check-in online na hotelaria: o cliente executa a tarefa quando for mais confortável e não tem a necessidade de esperar em filas nem ter contato físico na recepção, facilitando o processo e reduzindo os riscos.
Também entrou em voga a tecnologia do pagamento contactless. Com o uso de seus dispositivos móveis, o usuário pode fazer pagamentos sem contato físico, através de identificação por radiofrequência. Para os usuários que não façam uso desta tecnologia, existem ainda sistemas de pagamento online, atrelados aos motores de reserva e ao PMS do estabelecimento. Dessa forma, o cliente apenas coloca seus dados do cartão de crédito na hora de fazer a reserva, e depois o recepcionista pode fazer, dentro da própria reserva, todas as transações de pagamento com um clic, sem ter acesso aos dados do cartão do hóspede, de maneira simples e segura.
E depois do check in, recebo minha chave e vou para o meu quarto? Muitos empreendimentos hoteleiros já utilizam a tecnologia keyless. O viajante poderá usar o seu smartphone no lugar da chave-cartão. Dessa forma, não há a necessidade do contato com a chave, que pode conter contaminação.
Além disso, os serviços poderão ser agendados através de um aplicativo: café da manhã, serviço de quarto ou uso do restaurante ou áreas comuns, como piscina, academia, sala de jogos, a fim de evitar aglomerações nas áreas sociais. Nos restaurantes de muitos hotéis, o menu físico não existe mais e agora é apresentado geralmente em tablets para facilitar sua rápida desinfecção e limpeza entre manuseios. A mesma coisa aconteceu com o menu do serviço de quarto: sumiu o papel e ele está agora disponível na TV do quarto ou também em tablets.
2- Mais foco no lado humano
Se por um lado diminuímos o contato físico, por outro lado o elemento humano segue mais presente do que nunca na interação e na entrega dos serviços. Priorizar a criação de experiências inesquecíveis e o envolvimento com o destino e as comunidades locais é fundamental em tempos de distanciamento social.
As pessoas darão cada vez mais importância para um mundo realmente mais humano. Veremos também a maior humanização de serviços e a valorização das relações pessoais entre locais e visitantes.
3- Mudanças nos hábitos de reservas
As agências de viagens online se queimaram com muitos consumidores com reservas canceladas, o que acreditamos impulsionar as reservas diretas. Os proprietários também serão mais cautelosos com os depósitos recebidos, esperando para gastar apenas próximo da chegada do hóspede.
A maneira como os consumidores desejam reservar viagens também está mudando, assim como a forma como o dinheiro é trocado. Os hóspedes estão mais cautelosos e menos dispostos a pagar adiantado. Os turistas pagarão pela flexibilidade em um esforço para proteger seu dinheiro. Os planos podem mudar a qualquer momento e as pessoas não estão dispostas a colocar seu dinheiro em risco.
Os consumidores tomarão decisões de reserva de última hora. As viagens, que antes eram programadas com meses de antecedência, mudarão para dias.
Para se adaptar a essa nova realidade, avalie suas políticas de reserva, incluindo janelas de cancelamento e multas. Dê uma olhada em onde e como seus hóspedes atuais estão fazendo reservas e analise como você pode atendê-los melhor. Taxas de cancelamento e janelas de cancelamento curtas espantarão hóspedes preocupados com a possibilidade de mudança de planos de última hora.
4 – Viajante 4.0
O viajante 4.0 usa a internet em toda sua jornada de compra. Para conquistar este viajante, os hotéis precisam estar atentos às suas redes sociais, seus reviews e conteúdo compartilhado por outros usuários na internet.
Hotéis também precisam ser mobile first, isso significa que toda a experiência de compra tem que funcionar muito bem no mobile, além de estar integrada com a jornada de compra no desktop.
5- Reformulação dos espaços
As mudanças de comportamento dos hóspedes e restrições trazidas pela pandemia também geraram transformações físicas importantes nos hotéis. Dentre as importantes tendências para a hotelaria em 2021 estão os novos usos dados para espaços já existentes nos hotéis.
A adaptação de propriedades aos novos tempos incluíram, por exemplo, remodelar quartos para criar ambientes confortáveis para a prática de home office, inclusive em resorts antes focados exclusivamente no lazer.
Estruturas para convenções, inutilizadas em tempos de distanciamento social e ausência de grandes eventos corporativos, foram transformadas com sucesso em estruturas para home office e homeschooling em diversos hotéis.
Jardins se transformaram em áreas de café da manhã e restaurante, onde os hóspedes pudessem comer ao ar livre e com distanciamento, muitas propriedades adaptaram seus espaços para criar mais oferta de mesas ao ar livre na hora das refeições, e essa prática deverá continuar em 2021.
6- Extended Stays
Para muitas pessoas, viajar sempre foi sinônimo de aventura. Com a pandemia, essa comparação ganhou uma nova dimensão. São muitos protocolos de limpeza para serem seguidos, testes a serem feitos, riscos a serem calculados. Hoje em dia, viajar é um verdadeiro esforço.
Adicione nessa equação o fator econômico. Pessoas do mundo todo perderam seus empregos ou estão com medo de perdê-los. Por isso, é preciso pensar duas vezes antes de decidir gastar dinheiro em “extras”, como viagens de lazer. A crise financeira não é, por assim dizer, um estímulo para a retomada.
Por estes motivos, especialistas acreditam que viagens com estadias de longo período sejam uma tendência na hotelaria de 2021. As chamadas “extended stays” (estadias prolongadas) ganharam de vez a preferência de muitos hóspedes. E a expectativa é que essa mudança de hábito perdure também depois do fim da pandemia. Afinal, muitos viajantes descobriram, enfim, o prazer de curtir um hotel por mais tempo, sem correria, com segurança.
Menos viagens serão feitas e, quando realizadas, os viajantes irão querer aproveitá-las ao máximo com menos custo – o que significa hospedagem por mais tempo em um mesmo destino.
Tirar proveito ao máximo do que pode ser a única oportunidade de viagem parece ser uma conclusão óbvia ao se analisar as demandas de turismo.
7- Staycations – Foco no turismo local
Em época de tantas fronteiras ainda fechadas e do turismo doméstico fortalecido, apostar em um approach com alvo mais geograficamente definido faz sentido. Tem sido inclusive crucial nos índices de ocupação para os hotéis que realmente apostaram nas staycations.
Staycation, ou holistay, é um período em que um indivíduo ou família se hospeda e participa de atividades de lazer a uma curta distância de carro de sua casa. Em alguns casos, ele sequer necessita de acomodações noturnas. Mesmo com as restrições para o turismo, as pessoas querem sair de casa, variar os horizontes, equilibrar as energias. E a saída pode ser muitas vezes um hotel a quinze minutos da nossa casa.
Uma tradução mais livre seria “turismo bate-volta” – e isso não necessariamente é o mesmo que o turismo doméstico sob uma perspectiva de um país continental como o Brasil. A viagem de carro, seja com veículo próprio ou alugado, é uma opção viável e saudável, pois evita a conhecida aglomeração de um avião.
Muitos hoteleiros oferecem promoções e pacotes mais em conta para locais, fomentando essa prática e aumentando sua ocupação em épocas de crise.
8- Marketing focado na segurança
Mesmo com tantos países já iniciando seus processos de vacinação, as viagens em 2021 devem continuar tendo como um dos principais focos a segurança. Inclusive porque os planos de vacinação no Brasil ainda são incertos.
Confiança é, sem dúvidas, o novo luxo. As pessoas continuam querendo viajar – mas querem segurança, confiança e serviços personalizados. Algumas marcas hoteleiras mudaram inclusive seu approach de marketing durante a pandemia para se adaptar a essa nova realidade.
Vale lembrar que o planejamento de viagens focado em segurança não deverá se referir apenas à segurança sanitária. Como falado anteriormente, viajantes estão cada vez mais atentos e as boas políticas de cancelamento e reembolso em geral serão cada vez mais valorizadas por eles na hora de escolher um produto ou serviço.
Mesmo com tantas previsões, uma coisa é certa: ninguém sabe o que virá a seguir. O que podemos aprender com o ano de 2020 é esperar o inesperado, sempre com otimismo, mas mantendo os pés no chão.